A saúde mental dos professores
17 Agosto, 2020
Em tempos em que muito se discute a saúde mental durante o isolamento social, uma classe específica da sociedade enfrenta essa questão bem antes da pandemia: os professores.
Desde o ensino infantil até o superior, eles lidam com diferentes personalidades e desafios dentro da sala de aula e as mais variadas cobranças por desempenho, seja pela direção das instituições educacionais ou por grande parte da população.
Conversamos com uma psicóloga e diversas professoras dos mais variados níveis para entender como anda a saúde mental desses profissionais.
Segundo a psicóloga Juliana Rodrigues Enge, os professores possuem uma predisposição ao desenvolvimento de transtornos relacionados à saúde mental "devido à intensa exposição aos fatores de risco, como excesso de trabalho e cobranças, baixo reconhecimento e condições de trabalho desfavoráveis", justificou a psicóloga.
Neste momento delicado que vivemos, segundo Juliana, o isolamento social também contribui para a sobrecarga emocional dos profissionais da educação: "A pandemia e o isolamento social trouxeram evidente aumento do desgaste dos professores, que da noite para o dia tiveram que se reinventar e reinventar as formas de ensino e aprendizagem. Cresceram as queixas de que a carga de trabalho aumentou e cresceram também as exigências referentes ao ensino a distância, sem que isso viesse junto com um suporte adequado dos gestores."
A professora universitária Ana Claudia Brunier sente na pele os impactos da quarentena no dia a dia da sua profissão: "Agora, com a possibilidade da retomada das aulas dá uma certa síndrome do pânico por conta do medo de se infectar pelo vírus."
Já a professora infantil Suzelaine Eberle enfrenta o isolamento social com uma visão diferente: "O isolamento social provocou uma reinvenção nas nossas vidas e na forma como nos relacionamos. Estamos todos no mesmo barco, mas a pandemia me trouxe um olhar mais atento para a solidariedade e gratidão."
Independente do olhar que o profissional vê este momento, é uma unanimidade entre as entrevistadas que os professores estão sim expostos a problemas de saúde mental: "Acredito sim que os professores estão expostos ao desenvolvimento de transtornos mentais pela carga de trabalhar com pessoas heterogêneas e que possuem dificuldades financeiras e cognitivas, ainda mais nesta pandemia, que está fazendo com que os professores sejam, mais do que nunca, multitarefas." - afirmou a professora infantil Débora Brito.
Para a psicóloga Juliana Enge, os professores de instituições públicas estão mais vulneráveis ao surgimento desses transtornos: "Penso que o risco aumenta nos professores da rede pública devido à maior falta de recursos e suporte emocional oferecidos pelas escolas. Mas o professor da escola particular pode estar exposto a níveis de stress bem elevados também, mesmo com mais recursos de trabalho."
Mas para a professora Carolina Gonçalves Lopez De La Nieta, sua profissão não contribui para desgastes em sua saúde mental: "Pra mim sempre foi muito prazeroso trabalhar em sala de aula, é algo que eu escolhi por amor. Eu acredito que neste momento de isolamento, o acúmulo de tarefas e o home office tem aflorado o sentimento de ansiedade, mas não acredito que seja pelo meu cargo de professora."
Para a educadora física Fernanda Montenegro de Castro Nogueira, sua profissão é o que contribui para manter a sua saúde mental em dia: "Com certeza minha posição de professora tem feito eu não ter o desgaste na minha saúde mental".
A maioria das professoras entrevistadas afirmaram que conhecem colegas de trabalho que desenvolveram transtornos mentais em sala de aula: "De dez professoras que trabalham comigo, seis estão com acompanhamentos de psicólogos e psiquiatras, e tiveram as doses de ansiolíticos aumentadas durante a quarentena." - disse a educadora Débora Brito.
A psicóloga Juliana Enge concorda que os gestores educacionais devem oferecer medidas de amparo e preservação da saúde mental dos professores: "Principalmente neste momento, mas independente da pandemia, os professores necessitam de melhores condições de trabalho, necessitam de maior assistência e suporte emocional às questões vividas na escola, espaços em que possam expor e discutir sobre saúde mental. Os gestores têm que estar mais atentos a essas questões e fornecer e valorizar os espaços em que essas questões podem ser discutidas e cuidadas."
Uma das medidas mais buscadas pelas professoras que conversamos para aliviar o estresse causado pela profissão é a realização de atividades físicas.
"Faço atividades físicas 3 vezes por semana para ter mais qualidade de vida e também aliviar o estresse da vida cotidiana." - disse a professora Suzelaine Eberle.
Para a psicóloga Juliana Enge, os professores devem tomar cuidados que vão além do corpo: "Minha orientação é que os professores fiquem atentos a seus limites e que, se a escola não fornece espaços para cuidado das questões emocionais, busquem fora do trabalho o auxílio psicológico e psiquiátrico desde o começo dos sintomas, para que possam ser ouvidos, cuidados e ter seus transtornos tratados de forma adequada."
Entrevista a Víctor Freitas entre os dias 6 e 9 de agosto de 2020.