Pensar, conhecer e realizar - Uma crítica à educação tradicional - por Jorge Luiz da Cunha
11 Janeiro, 2018
O modelo de educação tradicional, em grande medida associado a transmissão de informações e não a desenvolvimento do conhecimento é, no mundo moderno, altamente conservador. Caracteriza-se como um modelo absolutamente produtivo para interesses alheios, instrumentais e exploradores. Porque mesmo quando legitimados ou justificados a partir de discursos ideológicos, de esquerda ou de direita, liberais ou não liberais, o resultado é sempre o mesmo. Depois de muito tempo sendo submetidos a receber informações, a título de conteúdo, de "matérias" necessárias das diferentes disciplinas ou áreas do conhecimento, as crianças, os jovens e os adultos submetidos a educação escolar tradicional são muito bem preparados para cumprir ordens, executar tarefas. Ou seja, são formados, são configurados previsivelmente para reproduzir e não para criar novos conhecimento e contribuir para a solução dos problemas de toda ordem no nosso tempo e do futuro.
Ainda que não haja nenhuma novidade no descrito acima, é preciso referenciar que este modelo caracteriza a educação escolar brasileira de modo geral, não raro associada a interesses que desconsideram a maior parte de nossa população.
As informações que compõem o conteúdo das diferentes áreas do conhecimento ou disciplinas escolares devem ser reconhecidas, pelos educadores e pelos alunos estudantes envolvidos, apenas como matéria prima para o desenvolvimento da uma capacidade criativa, contemporânea e racional. Uma prática destinada a estimular os questionamentos e a inventividade, ou seja, a criação de novas alternativas em todos os campos da existência humana.
Hoje, estes processos e práticas escolares associadas apenas à transmissão de informações, mesmo que discursivamente justificados ou temerariamente impostos por uma legislação conservadora, condenam a nossa profissão docente à extinção. Pois a tecnologia de ponta faz isso muito melhor do que qualquer professora ou professor pode fazê-lo. Mas, o questionamento, a significação, práticas que estão sempre intimamente ligadas ao que somos, as nossas histórias pessoais e coletivas são exercícios pedagógicos que criam a possibilidade de produção de conhecimentos e de consciência de si.
Portanto, recuperar a centralidade da educação no conhecimento e criticamente empenhar-se em superar a característica tradicional e conservadora da educação que, em grande medida, temos no Brasil, é uma prática necessária e consequentemente política. Transformar cada um de nós, que nascemos como animais, em humanos, é a garantia da profissão docente, a dignidade dela, e também, o papel social e político dela. Transformar em humanos aqueles que não o são, inclusive aqueles que estão envolvidos em processos escolares associados à disciplinarização, ao ordenamento, a previsibilidade, ao treinamento voltado somente ao mercado de trabalho é conservador; pois, fazer das pessoas mercadorias, que serão trocadas, vendidas, (des)valorizadas, carimbadas, etiquetadas, não é digno de qualquer profissão relacionada com a educação.
Esta questão, que recupera o conceito fundamental de formação associada ao conhecimento não é novidade. Está na origem do conceito de educação, desenvolvido na cultura grega a cerca de 2.500 anos atrás. Um conceito histórico que não descarta o papel dos espaços públicos como espaços educativos. Ou seja, além da formação física (bem-estar, saúde, desenvolvimento corporal), além da formação intelectual (aprendizagem escolar), também a formação social, ética e moral é fundamental para a constituição do humano. Essa última deve se dar nas ruas, nas praças, em todos os espaços públicos, onde as pessoas se reúnem, se encontram, e onde discutem os problemas e as soluções de si e de suas cidades.
Recupera o vigor originário da educação e das práticas educativas, pode levar (e leva!) à interpretação necessária de que a realidade objetiva, realmente existente, mas, igualmente transmitida por outros como visão exterior, através de diferentes estratégias sempre ancoradas na linguagem, precisa ser reelaborada. A modernidade conservadora ancora-se na estratégia social de fazer cada sujeito, mesmo quando organizado coletivamente, a atribuir a si e conceber sua realização a partir da "mesmidade" da identificação - identidade: - interiorizando e reproduzindo modelos e imagens.
As práticas educativas, historicamente acessadas até o tempo presente, possuem tanta unidade entre si quanto um arquipélago ou uma constelação. Mas, mesmo diante desta disseminação de territórios não deixam de ter unidade enquanto um conjunto de diversidades. Um corpus de sentidos, significados e estratégias, fundamentais para a ressignificação do conhecimento em seus variados contextos. E mais, creio que a recuperação da memória, disto que podemos chamar de genealogia das experiências educativas, pode nos levar a um campo investigativo precioso que nos permitirá construir as bases da crítica e da superação da identidade - estratégia tradicionalmente conservadora da modernidade atual - e alcançar uma nova instância, não apenas de compreensão e conceituação do humano, mas de sua sobrevivência e evolução: - a unidade!